
PREZADOS OUVINTES,
Em tempos antigos, quando ainda não havia a consciência do diálogo, quando a primariedade do ser humano era o que aparecia, o emprego da força bruta era a única salvação. Usava-se dos homens mais musculosos, mais fortes, como bravos soldados, para intimidarem os inimigos e lhes tomarem os produtos advindos do seu trabalho: caça, pesca, agricultura.
As guerras eram realizadas pelo emprego da brutalidade, da força descomunal. Quem possuía gente robusta, em seu país, poderia se dar ao luxo de guerrear, de mostrar seu poderio aos demais povos. Não havia a consciência das estratégias, porque o instinto animalesco de eliminar o próximo se fazia presente e o homem primitivo assim agia.
Com o passar dos tempos, a razão aflorou e o ser humano, mesmo afeito ao poder, às riquezas, continuou fazendo guerras, mas com estratégias, com emprego de armas e, posteriormente, com o uso da técnica e da tecnologia. Isso começou a funcionar tão bem que a indústria bélica (da guerra) passou a trabalhar as mais refinadas tecnologias. Guerrear dá bons lucros a muitos povos, tanto no uso do arsenal, quanto no ato de financiar a reconstrução dos locais atacados e dizimados.
Com o advento do estado de direito e, sobretudo, com a consciência dos direitos humanos, com a chegada do estado democrático de direito, em muitos lugares, a guerra deu lugar ao debate de ideias, ao discurso, ao parlamento. O surgimento do estado democrático de direito é uma aposta humana na capacidade de entendimento, de acordos amigáveis, de solução consensual dos conflitos. Para isso, desenvolveu-se o fortalecimento das estruturas jurídicas, com todos os seus segmentos, pois não é permitido ao cidadão comum resolver seus problemas com o emprego da força bruta, como o velho conhecido ditado: “fazer justiça com as próprias mãos”.
Entretanto, no Brasil de hoje, aflora a sensação de que é permitido empregar a força contra os mais fracos, para impor ideias, posicionamentos e, até mesmo, levar vantagens. É o que se vem presenciando nas grandes cidades, quando a Polícia invade as favelas e os barracos, para coibir o tráfico de drogas, e acaba matando inocentes, tirando o sossego de uma multidão de carentes. Mas, os grandes do tráfico, que habitam os grandes palácios, que manobram na política partidária, que dirigem empresas famosas, não são atacados e, sequer, mencionados.
A ideia de que “bandido bom é bandido morto” parece funcionar para os pobres. Quando há bandidos ricos, que insuflam o povo contra os poderes constituídos, até mesmo perdão inconstitucional lhes é concedido, porque bandido rico bom é bandido que oprime e escraviza o povo. E a polícia, em alguns estados, tem se prestado a invadir certas regiões e fazer matança indiscriminada. Aliás, a ideia do uso da força já chegou à Procuradoria Geral da República, órgão que foi criado para que se evite o uso da força bruta.
Também alguns agentes da PRF, nesta última quarta-feira, conforme noticiado, com imagens evidentes, deram uma amostra do emprego da força bruta. A grande pergunta é: até onde isso vai, sem que os culpados pelos abusos de autoridade sejam devidamente punidos?
Aqui, há que se fazer uma ressalva: a maioria dos agentes policias, de todas as corporações, é de gente séria e ordeira, de brasileiros e brasileiras que querem um país sério e sem violência. Mas, cá para nós, a invasão da cracolândia, das favelas, o abuso empregado em certas abordagens estão anunciando um mundo bárbaro, sem lei e sem punição aos que se acham donos do poder.
Chega de violência. Chega de tanta ignorância. O ser humano merece ser tratado com dignidade. Exigimos respeito ao povo
Essa é a nossa opinião.
(Editorial veiculado no “Linha Direta” de 27 de maio de 2022)
Portal C8 Notícias
Foto: SindbanRJ/divulgação